Um Relato de Porque #PODEMOS Enfrentar O Machismo

          Cresci como toda boa criança da Geração Y, ao redor de muitos desenhos animados. Época em que levantar cedo não era um problema, madrugava no sofá da casa de minha  avó para as diárias maratonas dos meus ídolos da televisão. As horas passavam e não me cansava de cada um daqueles mundos gráficos, em que as histórias tornavam-se as minhas. Entre monstros, robôs, espadas e cartas, testemunhei figuras juvenis fazendo de tudo para salvar o mundo. Não foi estranho quando pensei que era aquela a minha jornada.
          Os anos passaram, os monstros e robôs transformaram-se em dilemas adolescentes. Mas ainda assim, eu acreditava que uma profecia me ligaria a todo um enredo mágico. Se passava na televisão todos os dias, por que não poderia ser realidade? Mergulhei também no universo literário. Desta fonte emergiu mais forte a vontade de ser aquele herói dos romances de capa e espada.
          Mas como um balde de água fria, a vida me mostrou que todos os vilões dos desenhos não eram nada do que me esperava nas portas do mundo social. Sem motivo aparente, sofria chacotas de pessoas que não eram meus amigos. Gargalhavam sobre o meu jeito de falar, até mesmo da maneira como andava. Da forma mais dura, conheci o machismo.
          Atravessei os anos vindouros cultivando uma ira sobre mim mesmo. O que de errado havia em mim? Queria ser herói só por um dia! Nas confusões que se seguiram, um buraco se abriu sobre meus pés. Profundo, frio e apertado. Os comentários eram fortes e maldosos a ponto que podia sentir meu mundo ruindo. Eu tentava arduamente ser um soldado contra o meu próprio vazio. Cruelmente, eu compreendi o fardo de ser homossexual.
          Apaixonei-me por uma nova iorquina, com pouco mais de um metro e meio de altura, ítalo-americana, que cantava aos ventos que não havia nada de errado em amar quem você era, porque você nasceu assim baby. Ferozmente, ela me nomeou de monstrinho. Ergui minha pata e fui desbravar a solitária estrada em direção ao amor próprio.
           Quando fui aprovado no curso de licenciatura em História, todo o mundo que sonhava tomou uma outra forma. Os vilões agora não mais usavam capas nem máscaras, também dispensaram armas fenomenais para atingir seus objetivos. Usavam de seu poder para manter o mundo da maneira como estava, repleto de opressões que perpetuavam todo um sistema de explorações materiais e simbólicas. De mãos dadas machismo, racismo e LGBTTTfobia, maquiados por terno e gravata, regem este mundo sem piedade, matando sonhos e jovens. Não eram alienígenas, nem demônios milenares. São homens e mulheres de carne e osso.
          As coisas não vão bem, é preciso transformar toda esta estrutura e seus sujeitos. Mas como PODEMOS fazer isso acontecer? Como nas epopeias em que o baú do tesouro é aberto, uma palavra iluminou a cacofonia dos meus pensamentos, a educação. Cheguei a esta conclusão depois de muita desconstrução e luta nos movimentos que componho, principalmente no que se refere às experiências da luta dos feminismos de minhas companheiras.
          Ser professor em uma rede de cursinhos populares, a Rede Emancipa, clareou qual era o meu papel neste grande enredo. Construir a pauta LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) dentro de um movimento de juventude, o Juntos!, explicitou qual meu papel político dentro desta sociedade. Entender meu papel político foi compreender que eu também sou machista, chocado. Que as estruturas criam mecanismos para reproduzir o seu discurso misógino, meritocráta, racista em todas e todos nós.
         O primeiro passo para lutar contra o machismo, acredito, é enxergar suas contradições. Entender que reproduzimos preconceitos, muitas vezes inconscientemente. Em muitas piadas inocentes, há sementes que crescem e fragmentam sonhos e pessoas. Desconstruir o machismo não é também isolar, condenar as ações do outro sem parar e pensar nos processos que este vive. Não é justificar, é ouvir. Os processos de desconstrução são muito dolorosos e sem apoio um dos outros, como poderemos conduzir uma verdadeira revolução? Porque a revolução será de celebração ou não será revolução. O que nos move é busca de ser feliz.
         Aprendi que os monstros dos meus desenhos tem outros nomes, formas e aparências. Aquele assustado menino de olhos azuis cresceu, e ainda quer mudar o mundo. Quero ser herói, mesmo por um dia. Sou professor, sou sonhador, sou humano. Meu nome é Eduardo Augusto, tenho 21 anos, sou graduando em História, gay, frutinha, nerd, bicha, viado e enfrento o meu machismo no dia-a-dia. Há todo um mundo que precisa desta luta! Precisamos acreditar em nossos sonhos, afinal eles não nos abandonam, nunca dormem ou acordam.

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