Álbum em foco: XSCAPE ou liquidez da arte.

         Lançado em maio de 2014, o segundo álbum póstumo de Michael Jackson, XSCAPE, foi um dos lançamentos mais aguardados do ano passado. Composto por 8 faixas inéditas, que remetem à fases diferentes da carreira do rei do pop, a produção ficou a cargo de nomes como Timbaland e L.A. Reid, dentre outros produtores.
         Quando penso o álbum, seu impacto comercial e simbólico, acredito que podemos refletir sobre a liquidez que rege nosso cotidiano e afeta o processo criativo do ramo musical. XSCAPE não é um álbum surpreendente, principalmente tendo por vista as alterações que as músicas originais receberam, mas não foi tão frustrante quanto seu antecessor, Michael, tanto comercialmente quanto em acabamento. 
          Michael Jackson foi um artista que cresceu, viveu e morreu cercado por câmeras, flashes e manchetes. A mídia que incendiou a fogueira sobre ele, é a mesma mídia que o glorificou durante dias após seu falecimento. Agora vem desconstruindo um conceito fundamental, é preciso vender a arte mesmo quando o artista morreu.
         Nossa sociedade é bombardeada noite e dia por informações, a cada instante nos deparamos com variedades de narrativas e sujeitos. Na busca constante pelo novo, nos esquecemos do velho e de nossa identidade; tudo é rápido e instantâneo em nossa sociedade capitalista, vemos tudo tornar-se liquido, do amor à arte.
          Onde tudo é liquido e o importante é vender. Não mais importa que o cd, artista, tenha talento, opinião ou visão, é preciso atingir número absurdo de vendas. Os consumidores não refletem mais sobre o que lhes chega, mastigam o material que lhes é dito para comprar. Slogans, propagandas, títulos e recordes, a cada dia o sistema capitalista introjeta mais veneno no mundo fonográfico.
         Desse ponto de vista, acredito que XSCAPE tenha sido um álbum que sim, teve um bom desempenho comercial, mas ele é também um desleixo artístico. Desleixo, por como colocado acima, não foi o artista quem preparou o projeto. Não havia alma, nem o toque de vida que marcou as músicas do cantor, Foi feito unicamente para vender.
          Com certeza, houve alguma razão para que Michael não colocasse as músicas em seus trabalhos anteriores. Nunca saberemos o real motivo. Mas nisso centra a magia de ser fã de um artista, viver a resignificação de sua arte mesmo em sua morte,
           Precisamos entender que nem o Capital tem poder sobre a morte ou a arte. É necessário que tenhamos respeito com seu trabalho. Chegamos em um tempo em que precisamos questionar o que nos chega, e porque nos chegou tal coisa. Há coisas que valem mais que dinheiro, e Michael falava sobre isso em suas músicas. Devemos viver nossos artistas em sua completude, vida e morte. Uma constante dialética, que por sua complexidade nos deixa sem resposta, embora nos faça a dialogar melhor com os paradoxos da vida. 
           De forma geral, o álbum honra a discografia do eterno rei do pop. A melhor parte, são as demos das canções originais. Nos permite viajar, mesmo com suas delimitações, para uma das fases mais felizes do cantor, uma vibe anos 1980. Se você conhece apenas os singles, pare e ouça Chicago ou A Place Without A Name. Afinal, são músicas do rei e jamais vão "xscapar" de vista.


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